Helimar é pernambucano. Nascido no interior, viveu a fase adulta no Recife. Em 2016, escreveu o livro Coração na sombra. Vive em São Paulo desde 2017. Por aqui participou como aluno do CLIPE da Casa das Rosas e Vocacional de Literatura. Em 2019, publicou Tubarão seu segundo livro de poemas.
Atrás de casa criamos uma porca com todo espaço necessário. Amarrada a uma algaroba, do seu lado direito tem uma barroca onde ela passa o dia esparramada e um cocho feito com restos de um pneu, onde ela come. É de muita importância não deixar que nada aconteça.
Fui escolhido pelo meu pai para vigiá-la, estar atento aos bichos que querem comer sua lavagem. Cansei de espantar galinhas e timbus. Até quando meu pai previa que os cachorros estavam rodeando, pedia que eu estivesse pronto.
No terreiro peguei quatro pedras, duas em cada mão. Saí correndo pelo corredor do lado de casa, onde havia uma plantação de pedras e numa delas dei uma topada e caí de boca. O sangue lavou antes do meu grito.
A bica que leva água até a cisterna viu que minha havaiana ficou presa num buraco, e como eu estava com as mãos ocupadas, não pude reagir. O cachorro que eu espantei olhou pra trás depois da minha queda, baixou a cabeça e saiu andando devagar, desistindo de lamber a lavagem da porca.
Quando meu pai chegou eu havia soltado as pedras no chão. Com as mãos marcadas pela terra, fazia força pra me levantar. Ele me ajudou. Vimos no chão a poça de sangue e meus dentes moles, quebrados antes do tempo. Ele me disse que é assim mesmo a vida. Como a casa não tem geladeira, minha mãe fez uma mistura de vinagre e sal pra não infeccionar meus dentes. Não é pra beber, só boceje, vá, boceje.
Com o tempo meu pai vendeu a porca. Passei uma semana tomando suco de laranja. Minha mãe vive tentando me fazer sorrir pra que ela veja se tem pus na gengiva. Meu pai só pergunta se tá tudo bem. Eu só balanço a cabeça que sim. Mãe esperou que eu dormisse e senti ela mexendo no meu beiço. Ouvi quando disse pro meu pai que eu tinha ficado com uma pedra na boca.